quinta-feira, 22 de novembro de 2012

in mundo como chagas & condenação




escorpião é um bicho sensual, não acham?
há algo neste aracnídeo de frágil & forte, ao mesmo tempo, que lhe faz ser temido pelos outros animais (principalmente os humanos). não pela sua aparência, mas pela sua arma poderosa.
(todo mundo fica poderoso com uma arma, não é verdade? tire o canhão do braço do megaman, por exemplo, e ele se tornará apenas um “man”).
com um único tiro - pow!- você foi infectado pelo seu veneno; que ao contrário da cobra (símbolo quase sempre vinculado ao falo),
injeta seu veneno pela cauda, ou como diriam alguns machos: RABO.

falei do escorpião porque lembrei que estamos astrologicamente em seu mês. durante este período, sofremos influências daquele que no mundo dos signos é quem vive no “submundo”.

lembro-me que nos jogos do megaman
(ou rockman, se você preferir a versão japonesa)
as fases sempre mostravam o “perfil” do vilão. àqueles que representavam algum animal marítimo, tinham as fases em que jogávamos debaixo d’água. o mesmo acontecia com os animais “aéreos”. sendo assim, poderíamos imaginar que durante todo o período de escorpião lutamos contra os impulsos que nos aparecem pelo meio do caminho até chegarmos de fato no “verdadeiro vilão” (signo esse que é facilmente interpretado como “vilão”):

“Apesar da fama que este signo possui, ele é muito mal compreendido, talvez porque ele próprio não faça nada para melhorar a sua imagem. De fato, ele se esconde atrás de uma aparente frieza e desconfiança, levantando uma barreira quase intransponível ao seu redor.

Escorpião, como todo o signo de Água, é muito sentimental e suas correntes emocionais são intensas e profundas. No entanto, ele se mostra sempre desconfiado, especialmente, no que diz respeito aos seus próprios sentimentos e detesta responder a qualquer tipo de pergunta íntima e direta. Por ter um conhecimento profundo dos mistérios e segredos que envolvem a natureza humana, ele está sempre esperando que o lado mais sombrio do outro apareça e por isto ele vive 'de tocaia', na espreita.”

aproveitei a fase “fértil” escorpiana para meter o dedo na ferida
(na minha, no caso).
busquei no fundo do meu peito aqueles velhos sentimentos que sempre me foram novos. resgatei todas as coisas que me faziam feliz e que hoje eu me sinto “in vergonhado”.
cansei dessa porra toda. meu primeiro passo foi mudar. ficar mudo. a começar pelos livros.

acabo de ler o livro “chagas da condenação”, do meu amEGO e excretor ex-treante victor miranda.
em seu primeiríssimo livro
(um romance, para ser mais específico, escrito pelo próprio aos dezenove anos de idade),
victor constrói um rio de janeiro sitiado por vampiros, lobisomens e zumbis.

não vá pensando que você irá encontrar vampiros bonzinhos que se apaixonam por humanos; nem que vá encontrar lobisomens que abanam os rabinhos quando estão felizes. os vampiros do apocalipse
(se um dia acontecer)
serão aqueles seres que os “rpgistas” imaginavam que fossem. os lobisomens do livro mais parecem aqueles garous
(“Meio humanos, meio animais. Predadores que espreitam todas as matas e os becos escuros da cidade. Monstros que se aproximam lentamente de sua caça, como espíritos da Lua, e então explodem sua fúria, causando um frenesi de garras e presas. Feras que uivam durante a Lua Cheia e que saem para a caçada.
Lobisomens.”)
que costumávamos jogar e que sabíamos de fato que todo hominídeo seria incapaz de detê-los.
os zumbis também não ficam para trás. humanos sedentos por carne humana, fico me perguntando se eles não são os verdadeiros “antropofágicos”.
e no fim do mundo, a única criatura que ainda tenta sobreviver, além das baratas, são os seres humanos.
(baratas mais evoluídas, eu diria...).

bento batista,
(com direito a nome “bíblico”).
o personagem principal do livro,
(meu preferido, é claro).
parece ser o único humano capaz de sobreviver no dia do juízo final.
por quê?
porque bento parece não ter juízo, afinal.
seu instinto selvagem é mais elevado do que das outras criaturas:

“(...) sabe esses homens que vieram logo atrás? Um deles havia sido mordido e quando ele se pronunciou, o clima ficou pesado.
- É melhor você sair de perto então, não? – perguntou Isis, diretamente para ele.
Mas esse cara era do mesmo grupo do gordo que havia apontado a faca quando entramos no bar, que alias estava ali pingando de suor quase como um pano de chão. Eu não resisti e descontei no mordido.
- Veja pelo lado bom, você já vai morrer mesmo – provoquei – deve ter algum corpo de mulher lá dentro que foi devorado. Devem estar faltando alguns pedaços, mas acho que você ainda consegue tirar o atraso antes de partir – gargalhei.
- Seu babaca... Eu não faço questão de que você vá primeiro – ele sacou um revolver.
- Acho que não – o encarei ainda sentado, apoiando-me em meus braços que estavam um pouco atrás do meu corpo. “Então vamos ver se” foi a ultima coisa que ele conseguiu dizer antes de soltar a arma e cair de joelhos. Isis cochichava com a “amiga”, tentando decifrar o que aquilo poderia significar, mas quase todos já imaginavam. Ze e eu tínhamos certeza. (...) ”

com uma linguagem cinematográfica “tarantiana”, victor arruma uma maneira simples para passar a informação. contemporaneamente falando, ele se aproveita de aspectos dignos de quentin, tais como brincar de deus e assassinar alguns personagens sem demonstrar apego sentimental.

lendo sobre o personagem bento,
lembro-me de quando fiquei apaixonado pela filosofia de consolo
(literalmente)
do velho schopenhauer.

(arthur schopenhauer foi um filosofo alemão do século XIX, nascido no ano de 1788, para ser mais exato).

o velho schop foi o “pai da psicanálise”
(em minha humilde opinião).
dono de um imenso desprezo pelas pessoas, schopenhauer acreditava que os humanos são mais alguns animais neste planeta, lutando para perpetuar a espécie.

mas se os seres humanos são os piores animais deste planeta,
logo,
os seres humanos não deveriam lutar para tentar perpetuar a espécie.

em seu livro mais conhecido: “o mundo como vontade e representação”, o velho schop deixa explícito que o único defeito do ser humano, tal como acreditavam os budistas
(schop flertava com as religiões orientais.),
encontrava-se na palavra VONTA(R)DE:

“Aqui, portanto, o corpo nos é objeto imediato, isto é, aquela representação que constitui para o sujeito o ponto de partida do conhecimento, na medida em que ela mesma, com suas mudanças conhecidas imediatamente, precede o uso da lei da causalidade e, assim, fornece a esta os primeiros dados."
- trecho de "o mundo como vontade e representação".

eu, fiel leitor de schop, também acredito que todo ser humano são motivados pelos seus instintos biológicos que transcendem a razão.
fazia das palavras do velho as minhas próprias palavras. fazia isso até conhecer o vovô freud.

o que o velho schop não sabia, mas que o vovô freud de fato saberia mais tarde
(freud nunca disse explicitamente que era leitor de schopenhauer, apesar de suas teorias “semelhantes” - uma característica sua de não querer assumir algumas coisas, diga-se de passagem),
pode ser obervado em sua teoria do RECALQUE:

“A teoria da repressão é a pedra angular sobre a qual repousa toda a estrutura da psicanálise. É a parte mais essencial dela e todavia nada mais é senão a formulação teórica de um fenômeno que pode ser observado quantas vezes se desejar se se empreende a análise de um neurótico sem recorrer à hipnose. " (Freud, 1914, p. 26)”

“Ora, o recalque pode ser entendido como um dos possíveis destinos dos impulsos libidinais provenientes do ego, se estes entrarem "em conflito com as idéias culturais e éticas do indivíduo", ou restrições sociais impostas a esse indivíduo, as quais são reconhecidas "como um padrão para si próprio". (Freud, 1914, p. 110) Podemos afirmar, então, que, em 1914, o recalque "provém do amor-próprio do ego", amor-próprio que, afinal, é a forma de resguardar a libido de investimentos objetais que não permitam algum tipo de satisfação narcísica (Freud, 1914, p. 110). A partir disso, podemos afirmar que a formação de um ideal é, do ponto de vista do ego, fator condicionante do recalque: "O ideal do ego impõe severas condições à satisfação da libido por meio de objetos, pois ele faz com que alguns deles sejam rejeitados por seu censor, como sendo incompatíveis. (...) Tornar a ser seu próprio ideal, como na infância, no que diz respeito 'as tendências sexuais não menos do que as outras - isso é o que as pessoas se esforçam por atingir como sendo sua felicidade." (Freud, 1914, p. 118)”

o caráter de bento
(como diria reich)
nos ajuda a enxergar os mecanismos de defesa encontrados pelo próprio protagonista a fim de se proteger das decepções que teve como resultado do convívio com outros seres humanos.

e como victor não poupa ninguém
(nem mesmo o seu personagem principal),
de uma maneira cômica e sarcástica, ele revela as contradições que escapam nas palavras e ações de sua personagem
(personagem= persona= (Origem do Latim) - Pessoa, traços e identidade particular. no teatro grego persona era a máscara que os atores usavam).
bento é um “prato cheio” para os analistas freudianos:

“ E assim que a dupla entrou, o garoto perguntou para mim após Zé fechar a porta.
- O que houve com você?! – ele parecia surpreso a me ver sem camisa e sujo de sangue. E ela talvez pela exposição das minhas costas definidas e ombros largos com aquele ferimento radical e sexy” 

há momentos (como esses) em que o protagonista parece sentir-se excitado com o próprio corpo, deixando escapar algumas frases onde aparenta ser “homossexual” tanto quanto o personagem “Leafar”.
(personagem esse que bento vive encarnando.
e que para mim é o personagem mais “macho” do livro; já que ele aguenta “coisas” que homem nenhum é capaz de aguentar, como diriam as piadas machistas).

ao longo do livro eu fui surpreendido
(mais pelo victor do que pela história)
com as possíveis “recaídas” do personagem em relação aos seus sentimentos:

“ Dentro da Kombi, estávamos em silêncio. Não por m clima ruim, mas pela falta de assunto mesmo. Eu tinha algo a dizer, mas não sabia como. E toda vez que eu tentava, me calava antes de pronunciar algum som. O maldito havia percebido como percebeu tudo que era oculto em mim antes.
- Algum problema, bento?
- Hm – tossi disfarçando – fora esse dela ter fugido com o meu amor – destaquei as últimas palavras – de novo?
- Sim, eu estava pensando nisso ainda, mesmo com tudo isso acontecendo. Meu amor por aquele carro sempre foi verdadeiro e parecia que o destino sempre queria nos separar.
- Sim.
- bem, você sabe...Eu não tenho muitos problemas – dei de ombros.
- Sei.
- Mas... Eu só queria te agradecer, por você ter me ajudado a resolver um desses poucos...
- O quê? – perguntou ele, querendo saber mais.
- Bom...Eu disse tanto isso a você, quando na verdade, eu deveria prestar atenção. Eu estou abrindo meus olhos e você...
Bem...Está me ajudando bastante...Obrigado – eu disse isso com a voz firme, enquanto olhava para estrada, como se tivesse agradecendo por um copo d’água na casa de um desconhecido.
Ele sorriu. E me deu uma resposta profunda (...)”

em momentos reflexivos como esses, podemos entender que o trabalho do excretor é justamente se entender com ambas as partes do nosso corpo funcional: RAZÃO & SENTIMENTO.
(e victor sabe muito bem disso!).

e foi desse jeito que eu fui le(a)vado pelas minhas lembranças.
recordando maneiras criadas por mim em tentar sobreviver a esse mundo que está condenado a ser livre
(como diria sartre).
lembro-me dos meus primeiros aprendizados com os jogos vídeo-games e rpg’s. aprendizados esses que professor nenhum foi capaz de nos (eu, victor & bento) ensinar.
(aproveito aqui para enxugar o veneno que escorre da minha boca.
da BOCA e não do RABO, que fique bem claro...).

hoje, assim como o filósofo alemão friedrich wilhelm nietzsche, percebo que maior do que a pulsão de morte é a pulsão de vida.
ao contrário do pessimismo schopenhaueriano e freudiano
(ao contrário deste último, especificamente,  nietzsche deixou explícito a sua (re)leitura schopenhaueriana, e sua principal desavença com relação a teoria do velho schop),
o filósofo bigodudo acreditou que “a vontade de viver” é o nosso principal objetivo de vida.

dessa maneira,
victor e bento me fazem refletir sobre a ideia do mundo, na qual todos nós somos condenados a sobreviver.

mais fácil seria se tivéssemos que conviver com criaturas apocalípticas, eu confesso
(remorso não haveria quando resolvessemos matar algum deles pelo simples prazer em matar).
mas não posso deixar de pensar que a morte existe justamente porque existe a vida também. e ela, quando chegar o dia do juízo final, será a nossa única aliada.

acabo de lembrar da frase daquele que também foi meu professor durante um “looooongo” período de minha vida
(ou morte, como queiram...).
na época de transição da minha fase da adolescência para minha fase adulta- sir CHARLES CHAPLIN:

“A única coisa tão inevitável quanto a morte é a vida”.