terça-feira, 25 de junho de 2013

Rio de Janeiro -24/06/13 – Segunda



Eu estava andando, coçando a minha barba, pois isso me faz pensar, pelas ruas do Baixo Botafogo, ali perto do cinema Estação, onde ficam vários bares um colado com o outro, quando vi as ruas infestadas por pessoas.
Como eu havia me lembrado do primeiro sonho que tive , praticamente no mesmo lugar, também com muitas pessoas contentes pelas ruas, sabia que aquilo era por causa da Revolução.
Diferente do outro sonho, nesse, as pessoas, assim que avistavam policias se aproximando, começavam a se beijar. Se agarravam e tiravam suas roupas.

(Para ler ouvindo “Paula e Bebeto” na voz do Milton Nascimento).

Sempre que a policia passava de carro olhando para a cara de cada um deles, eles cagavam para os “defensores da ordem” e se importavam somente com o ato de se amarem.
Vi catadores e catadoras de latinhas - bêbados, como sempre - comemorarem e tirarem suas calças, fazendo bundalelê. Garotas sem saias, homens sem calças, velhos se beijando e se preparando para tirarem suas roupas e até crianças que entravam na onda dos mais velhos.
Os policias, é claro, ficavam sem reação e olhavam para aquilo tudo com uma reação constrangedora.

(E quem não fica “sem graça” com as”sem-vergonhices” dos outros?).

Eles não podiam ataca-los, afinal, eles estavam praticando um ato de amor. Com eles mesmos. Sem se preocupar com quem quer que seja.
Não dá para lutar se o seu oponente decide não lutar. Assim como o diálogo, a luta só acontece se tiver o mínimo de dois lutadores (uma luta justa, eu diria).

Senti-me contente e curioso com a forma que eles haviam arrumado de “tocarem” as pessoas sem precisar de "agressões físicas". Ali, eles provavam que o corpo também pode se manifestar. E que o Amor pode ser até mais prazeroso e divertido do que o ódio. Afinal, é uma manifestação que valoriza a vida.

Eu sabia que o “Amor e o Ódio só se diferenciam nos atos”.
(lembrei do Outro Gêmeo).
Então a mesma raiva pode ser aplicada em em outras coisas, ela também pode ser uma manifestação de Amor.

Entre os labirintos do centro da cidade e da complexidade, eu pensava que essa talvez fosse a melhor manifestação que podíamos arrumar para acabar com toda essa onda de violência por parte dos dois lados: Direita x Esquerda, Policias x Vândalos, Policias x Bandidos... (Es)Forçaríamos as pessoas a se amarem na prática.
E isso , além de atordoar o governo, daria mais tempo para aqueles que querem “mudar” o país. Todos os que estivessem na faxina poderiam ficariam em paz; já que os outros amigos estavam ajudando, levantando os móveis.

Continuei caminhando:
- Keep Walking.
Revolução se faz com afeto.

Senti a minha barriga doer.

(Algo estava prestes a nascer).

quarta-feira, 12 de junho de 2013

André Severo, o poeta sossegado.

Há tempos não escrevo pra cá. Tenho estado em tantos lugares ao mesmo tempo que o pensamentório ficou esquecido. Ele e mais um monte de coisas. Força de um destino que não pretende ser esquecido também. O esquecimento é o lugar mais frio que existe na Terra. Quiçá, no universo. Mas como evitar o esquecimento, usando essa tal força do destino, sem ser levado em consequência pelo efeito colateral dela, pela angústia e pela ressaca que nos abraçam mansas como uma reação alérgica? "Elevando seu estado de espírito", nos diriam alguns espirituosos cientistas. Gosto de combinar as duas palavras: e-s-p-i-r-i-t-u-o-s-o-s c-i-e-n-t-i-s-t-a-s. Acho que tem tudo a ver. E o que seria elevar um estado de espírito? É transportar sua existência para a afirmação, através do sossego. Só o sossego pode nos tirar do ostracismo, nos dando força e sem deixar que participemos dos tais efeitos colaterais. Porque é no sossego que se consegue o melhor aproveitamento para as chances darem certo. E é o que acontece sempre. Li recentemente o livreto artesanal de poemas do meu irmão astral bode fantasioso André Severo, que além de poeta e músico, assim como eu, é o ilustrador de sua própria obra; que compreende que um poema deve ser tratado com carinho e cuidado, mesmo que não haja amor, assim como eu; que tem medo do meio literário, que pega, mata e come, assim como eu; que não se dedica para ser reconhecido por ele, mas nem por isso deixa de escrever para os poucos ou para o nada. André Severo sustenta a bandeira dos artista alternativos do submundo mas detesta ser comparado aos famosos poetas de rua, que vendem seus poemas por migalhas. Poeta não mata a fome, mas poema não é migalha. E para se atingir esse alto nível de elevação espiritual, de criatividade e cabeça tranquilas, basta estar sossegado. E foi por isso que ele deu ao livro, em homenagem, o nome "sossego".

O sossego é um estado de espírito genuinamente brasileiro. Para ser mais exato, baiano (favor não confundir com a preguiça). Sustentado por grandiosos baianos, como Jorge Amado e Dorival Caymmi, o sossego já foi parar em discussões, debates, palestras e teses por aí afora. Muitos salões e galerias pelo mundo já abrigaram o sossego. Todo artista de valor deve estar sossegado. Reparem que o verbo "estar" nesse momento é crucial para se entender a prática de como atingir o sossego. E é aqui que muitos artistas procuram uma saída, uma solução rápida nos psicoativos. Não quero defender e nem bater contra. Cada um busca a maneira que deseja. De uma maneira ou de outra, o sossego consegue fazer milagres. Somente uma pessoa sossegada consegue escrever poemas. Somente uma pessoa sossegada consegue ser poeta. Somente uma pessoa altamente poética consegue ser sossegado ao ponto de escrever poemas, diagramar, formatar, recortar, ilustrar e editar seu próprio livro de forma independente e sem cair na pobreza famosa das ruas. André Severo dá o acabamento do livro dedicando uma boa parte do seu tempo para xerocar todas as impressões, uma por uma. É um "paradoxo", criado pelo homem, dizer que o sossego nos impede de agir. Mas é justamente o contrário disso. É preciso estar firme e tranquilo para se locomover, conforme atesta o livro "O Tao do Jeet Kune do", do Bruce lee. Como foi visto nos pés bailarinos e nas mãos porradeiras de Muhammad Ali e também na boca de Martin Luther King Jr. Não à toa, na primeira página do livro, André escolheu começar com a seguinte frase do Ativista político: "Quase sempre/ foi uma minoria criativa e dedicada/ que fez o mundo melhor."





O livro foi feito para ser lido sossegado, literalmente. É um livreto, pequenino, mas que recebe a poética em peso através de diferentes linguagens artísticas. Seus poemas aparecem em algumas ocasiões como artes visuais, sendo ao mesmo tempo recortes e pequenas letras de música, som e surdez: "as caixas de fósforos soam/ e cantam no bolso/ chacoalhando conforme a marcha/ (A verdadeira música urbana)/ Dentro da noite silenciosa/ de tão sozinha...". E às vezes como poemas concretos e ilustrados, como podemos ver nos dois poemas abaixo: (Uma pena vocês não conseguirem virar a tela do computador da mesma maneira que fiz para ler o poema concreto.)





Claro, mesmo com sossego e todo cuidado e dedicação, o livro custa tempo para ser produzido. Muito mais do que dinheiro. E por isso André Severo faz questão de colocar um valor, mesmo que "simbólico", em cada livro impresso. Ninguém está impedido de ganhar uns trocados. Mas André Severo coloca em questão duas perguntas antigas ao homem: "É possível alcançar a felicidade mesmo sem ganhar dinheiro?" e "Como ser feliz fazendo o que se gosta?". Acho que o sossego é a melhor resposta.