segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O respeito que move montanhas

Enquanto formos jovens, poderemos passar por cima de qualquer entendimento. Mas depois de velho, o entendimento passa por cima de nós. Não há, em nenhum momento das nossas vidas, um encontro mútuo e contínuo de cumplicidade entre os fatos.

(...)O que alguns não sabem é que, em todas às vezes, trocamos o entendimento por respeito; E que, todos nós, chegamos ao fim sem conhecê-lo.

Na medida em que a idade avança, piora o nosso entendimento das coisas.
Para isso, existe sempre respeito.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Grotowski

espírito meu que me pertence
existe alguém neste palco mais
distorcido do que eu? Neste momento
a bruxa maligna aparece solta, rindo da

minha cara refletida nas vidraças da quarta
parede. As minhas córneas em altas definições
presencio um súbito, o óbito da platéia em cena
numa crise de silêncio absoluto

uivos em ventanias, transformam-se em medos
ofuscantes. Não há como prever o futuro
com lentes de contatos ou óculos escuros
contra raios ultra-violetas
há sim,

alguma coisa estranha
entre as minhas letras e estas cadeiras
que acumulam poeiras

e mais poeiras
que me impedem de crescer
consumir pêndulos

espelho, espelho meu
existe alguém aqui
que esteja afim de
me entender?

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Assassinato imediato de primeiro grau




Eram quase quatro horas da manha. Era uma hora da madrugada silenciosa. Faziam mais de três horas que eu tentava dormir, em vão.
Eu olhei para o relógio ou o relógio olhou para mim. Sei lá. Ele me apontava os ponteiros. Chegava a hora do juízo final ou o final do meu juízo.
Onde eu estava até aquele momento?
Digo momento e sinto o momento vindo à memória. Ele tem um gosto. Momento tem gosto de menta. Mentira que os outros nos contam. Vem na mente o sabor do agora. Arde. Memória tem um sabor mais doce. É o momento de antigamente.
Estou tomando cerveja com Deus, ou era o Diabo, sei lá, os dois são bem parecidos quando os olhamos de perto.
Deus e o diabo na terra do samba! Carnaval! A festa do menino morto. Que menino? Não sei, só consigo enxergar o sangue na parede. Sangue tem gosto de ferro, barra enferrujada, barra de chocolate na face, gosto de morte.
Apostei com o Diabo! Enquanto Deus ria de mim
- eu não quero a tua alma.
Eu digo:
- calma alma minha, você ainda vai se arrepender.
Ele queria minha cabeça em uma bandeja de prata. Batucada de bamba. Caipirinha com o álcool dos deuses.
Todos nós rimos. Menos eu. O outro eu. O que está deitado na cama, morto.
Eu conseguia sentir o cheiro de morte. É parecido com o cheiro da vida. A vida fede. Fatídica. Fatal. Female Fatale. A morte é a vida Severina. Serena às vezes severa. Você sabia que a cor da morte não é escura? a morte não é negra,pelo o contrario ela é clara, clara demais que chega a doer os olhos!
E essas cores? Cores de Almodovar. Estou em um quadro de Salvador Dali. Dali ninguém me salva. As cores desenhavam a cena do crime.
A lua iluminava a minha consciência. Ela já havia testemunhado tudo. O quarto todo presenciou o crime.
Eu tentei dormir, mas não consegui. Eu só conseguia ficar acordado. Atordoado. Algemado pelos os olhos arregalados.
Acho que foi a feijoada antes de dormir. Era carnaval. Carros alegóricos expressionistas. Passistas desfilavam com fantasias místicas. Filavam a sobremesa,que é sempre o pior. É pior porque não me deixa dormir. Maldito doce! Bem que a minha vó me disse para não comer doces antes de dormir. Isso se você pretende justamente ir dormir.
Acontece que o assassino mora ao lado, quer dizer, mora dentro, dentro da gente. E a vítima estava ali ao meu lado na cama, no lado escuro do quarto. Encarei-o até o reconhecer .
Por mil deuses endiabrados! aquele era eu!
Como assim eu? Tu sim! Eu não! Então quem foi?
Foi o eu!
O eu roubou doces na casa de João e Maria!
Quantos eus estavam lá para me incriminar? Eu sei lá ! você enlouqueceu? Eu vejo nesta palavra um eu que não se percebe. Por que logo eu?! o gato comeu! cadê o gato? Foi embora e só deixou o sorriso...
Estávamos todos ali reunidos. Eus que eu nunca havia visto na vida. Eu vestido de santo, eu vestido de guerreiro, tinha até um eu vestido de mulher. Todos esses eus que nos habitam. Inquilinos do nosso próprio corpo.
E como eu vou saber que eu matou eu?
- o eu ditador morreu! Vida longa os eus!
Gritou eu revolucionário.
Todos olhavam para mim e me acusavam com os meus próprios olhos. Como foi que aconteceu? Olha outro eu aparecendo por ai.
Subi no Magic bus e decidi voar de volta no túnel do tempo. O vento batia no meu rosto e marcava a minha testa com lembranças com cheiro de mofo. Mas era bom. O mofo traz saudade, saudade que tem gosto de sal, o sal de Hades.
Enquanto isso, aproveitei para passar o dedo no arco-íris que tem gosto doce, esse doce que não me deixa dormir.
Cupidos cagavam na minha cabeça. Merdas de cupidos são as piores, pois mancham a dignidade do homem.
Acordo em um lugar escuro. Silêncio. Canção de todo o mundo. Do mudo. Batida cardíaca. Som de útero materno. Iluminou-me a barriga saber que desde a época em que eu dormia no ventre de minha mãe, eu carregava em meu ventre, bem no meio, no centro do corpo. O umbigo que é o centro do meu universo. Ele e eu nascemos, onde nascem todas as coisas, inclusive o amor.
Ele-eu crescemos no meu corpo e éramos bem parecidos. Dividimos os mesmos braços, pernas, olhos e até os mesmos pensamentos. Dividimos a mesma cabeça sobre o mesmo teto capilar. Tivemos crises existenciais como qualquer pessoa normal que sofre de dupla personalidade.
O problema maior veio quando passamos a dividir o mesmo amor platônico.
Já dizia o Espírito Santo: - Dois é bom mas três é demais.
Ele queria ela só para eu. E eu também. E como dois eus não se beijam, começamos uma discussão:
Tudo começou com um tapa. Um tapinha. De leve antes do doce.
Ele me acusou de ter roubado o parabéns que ela havia lhe dado. Eu o acusei de ter sido autoritário. Eu me disse que eu não poderia nunca amar uma pessoa que existe. E eu o acusei de eu ter perdido os momentos da minha vida em que eu poderia ter morrido em paz. Morrido de rir. Morrido de alegria.
E foi assim que eu comi o doce. O doce envenenado. Ele ainda gritou:
- Eu voltarei!!
Mas já era tarde. Tarde pra caramba!
Estávamos apenas nós dois. Só eu. O outro eu estava morto. E eu estava livre. Não era mais eu. Éramos nós! um coletivo de eus.
- Livre!!
Livre para conversar com qualquer música! livre para pintar o mundo com os meus próprios olhos. E livre para mastigar os meus textos amargos no âmago do papel. Passe a língua em cada palavra minha e acreditem, a maiorias delas tem sabor de melancia.
Assassinei o meu ego. Que alívio. Tirei os pregos que me grudavam na cruz. Tirei o peso do mundo. Eu era o mundo!
Eu sou Deus! ou o diabo, sei lá, nós três somos bem parecidos quando somos olhados de perto.
Respirando um novo ar. Acordado em um novo acorde. Deitado no ventre do mundo. Com cores. Sem dores. Um mundo para mim e para ela. Um mundo paralelo. Para Hêlo.
Peguei carona no submarino amarelo. Mergulhei na onda. Onde? viagem ao centro de mim.
Acreditem, isso não é morrer, é renascer!

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Esfinge

Eu não sei fingir
devoro-te
sem você precisar
me decifrar

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Um mundo novo, baiano!

(um álibi para o Sr. Walter)

vá, vá tomar a sua cerveja
e esqueça que um dia
o passado te pertenceu

deixe a torneira aberta
épocas boas servem para
passarmos adiante

volte a gritar,
paz e amor,
como os hippies!

ainda consigo sentir a essência
de um monge budista, da Tailândia
ou de Sta. Teresa, enquanto você serve

ao mundo os seus grãos de sutilezas.
mas quem passa de longe não percebe
que o futuro hoje te pertence

e não vá dizer aos outros que
a minha esquizofrenia roubou
a beleza

nada pode tirar a saudade
daquele jovem moço
que antes vendia cordão

pulseiras e bijuterias
batia ponto na Barra
mas que hoje recita

poemas de cabeça
à geração que se cala de medo
vá, vá tomar a sua cerveja

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Cinematofagia






Toda luz da manhã traz consigo o roteiro das câmeras invasoras domiciliais. Todos os deuses roteiristas nos escrevem sem prescrição médica mediúnica.
Hollywood mon amour é um prato cheio para todos aqueles que praticam o canibalismo tântrico.. Começo o meu dia devorando Claudio Assis assado. Cinema brasileiro é bom acompanhado de cerveja em um dia de sol. Enlatados ? já basta as pastas pastiches do cinema europeu. Saboreando cada comida com gostinho típico dos estados marcados pelas as culturas subjetivas. Pizza italiana só é boa com molho de neorealismo; cinema russo dormido e frio na geladeira; vale a pena experimentar comidas orientais só para dizermos que somos cinéfilos exotéricos; cinema francês, é que faz comida boa !
A gula não é pecado quando estamos famintos por arte com o desejo dos deuses famintos. Mc Donalds nunca vai ganhar a concorrência cinematográfica. Chaplin foi o primeiro palhaço a vender big movies. Nas horas divertidas peça o número 4, four brothers Marx traz um como um brinde, uma tesoura, a mesma que Edwards usa para acariciar as meninas de bochechas rosas.
Godard faz abrir o apetite intelectual. Depois de tanta orgia alimentícia, arroto com todo o trabalho de montagem cada take-tac que ajuda no hálito refrescante das bocas salas escuras.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

borboletas

se ficarmos aqui
presos nesta janela

jamais descobriremos como é
pisar naquele calçadão

os primeiro passos de
uma criança

serão os últimos daquele casal
se abraçando no banco

iremos ouvir os passarinhos
lá fora?