O sossego é um estado de espírito genuinamente brasileiro. Para ser mais exato, baiano (favor não confundir com a preguiça). Sustentado por grandiosos baianos, como Jorge Amado e Dorival Caymmi, o sossego já foi parar em discussões, debates, palestras e teses por aí afora. Muitos salões e galerias pelo mundo já abrigaram o sossego. Todo artista de valor deve estar sossegado. Reparem que o verbo "estar" nesse momento é crucial para se entender a prática de como atingir o sossego. E é aqui que muitos artistas procuram uma saída, uma solução rápida nos psicoativos. Não quero defender e nem bater contra. Cada um busca a maneira que deseja. De uma maneira ou de outra, o sossego consegue fazer milagres. Somente uma pessoa sossegada consegue escrever poemas. Somente uma pessoa sossegada consegue ser poeta. Somente uma pessoa altamente poética consegue ser sossegado ao ponto de escrever poemas, diagramar, formatar, recortar, ilustrar e editar seu próprio livro de forma independente e sem cair na pobreza famosa das ruas. André Severo dá o acabamento do livro dedicando uma boa parte do seu tempo para xerocar todas as impressões, uma por uma. É um "paradoxo", criado pelo homem, dizer que o sossego nos impede de agir. Mas é justamente o contrário disso. É preciso estar firme e tranquilo para se locomover, conforme atesta o livro "O Tao do Jeet Kune do", do Bruce lee. Como foi visto nos pés bailarinos e nas mãos porradeiras de Muhammad Ali e também na boca de Martin Luther King Jr. Não à toa, na primeira página do livro, André escolheu começar com a seguinte frase do Ativista político: "Quase sempre/ foi uma minoria criativa e dedicada/ que fez o mundo melhor."

O livro foi feito para ser lido sossegado, literalmente. É um livreto, pequenino, mas que recebe a poética em peso através de diferentes linguagens artísticas. Seus poemas aparecem em algumas ocasiões como artes visuais, sendo ao mesmo tempo recortes e pequenas letras de música, som e surdez: "as caixas de fósforos soam/ e cantam no bolso/ chacoalhando conforme a marcha/ (A verdadeira música urbana)/ Dentro da noite silenciosa/ de tão sozinha...". E às vezes como poemas concretos e ilustrados, como podemos ver nos dois poemas abaixo: (Uma pena vocês não conseguirem virar a tela do computador da mesma maneira que fiz para ler o poema concreto.)

Claro, mesmo com sossego e todo cuidado e dedicação, o livro custa tempo para ser produzido. Muito mais do que dinheiro. E por isso André Severo faz questão de colocar um valor, mesmo que "simbólico", em cada livro impresso. Ninguém está impedido de ganhar uns trocados. Mas André Severo coloca em questão duas perguntas antigas ao homem: "É possível alcançar a felicidade mesmo sem ganhar dinheiro?" e "Como ser feliz fazendo o que se gosta?". Acho que o sossego é a melhor resposta.