quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Elemento Amor

Tudo o que é sólido pode derreter

(parte dois)

Débora reconheceu Rodrigo. Ambos estudavam na mesma escola embora fossem de séries diferentes: ele estava no terceiro e ela no segundo ano do ensino médio (dos tempos da minha idade, média.)

O que era para ser um simples acaso de encontro se transformou em rotina. Uma questão de obrigação sentimental.

Passado dois dias se olhando no parque, no terceiro dia durante o intervalo, se olharam, confirmando o encontro no paraíso tropical.

Rodrigo aproveitou as aulas de literatura e decidiu levar um livro.

Nada de expressionismo alemão, dessa vez decidiu ler poesia brasileira (Carlos Drummond de Andrade é mais romântico que Goethe).

- eu já estou começando a pensar em morar aqui. – disse ele impulsionado pelos versos de Drummond.

- sério? e por quê ?- respondeu ela um pouco tímida como as flores.

- só assim te vejo sempre; e todos os dias.

- mas nós já não fazemos isso?

Ele pensou no que falou e olhou para o livro. Ela percebeu que o esforço foi válido. Foi com esse diálogo clichê que o casal começou a fincar suas primeiras raízes.

Nos dias que se seguiram, os dois agora se sentavam no mesmo banco, um ao lado do outro. Suas raízes ficavam cada vez mais fortes.

Foi sob o chuvisco de arco-íris no chafariz que plantaram o primeiro beijo &

Foi ali que fizeram as primeiras aspirações pós-escolar.

Rodrigo queria ser filósofo e não era para impressionar a menina (após alguns segundos, ela percebeu que aquilo não era uma piada).

Débora queria ser diplomata e não era o que Rodrigo pensava.

Mas o começo de namoro tem dessas coisas, esquecer tudo o que você não concorda para levantar a bandeira da paz sem que haja guerras motivadas por besteira.

Ele tentava estudar para passar em alguma faculdade pública. Ela estudava para passar de ano (perceberam a diferença de estudos?)

Escreveram juntos, num tronco de arvore, o seu mais novo amor eterno. Marcaram na árvore genealógica que sonhavam um dia construírem. Nenhum dos dois sabiam que o eterno um dia acaba. O paraíso é tomado de nós e o efeito do veneno acaba.

Um ano se passou.

Rodrigo não passou para a faculdade. Decidiu arrumar um emprego e pagar sua própria faculdade de filosofia. Depois de algum tempo, percebeu que o problema não era a faculdade e sim a filosofia. Depois mais algum tempo, percebeu que o problema real não era a filosofia e sim as pessoas.

Enrolava com a faculdade e se acostumava com o trabalho que tinha.

Débora terminou a escola e o curso de inglês. Começou a fazer um curso de pré-vestibular e um curso de francês. Sonhava em um dia estudar na França enquanto enrolava a língua.

Rotina faz parte da vida, nós é que nunca nos acostumamos a ela.

Rodrigo saía do trabalho a noite e todo o dia passava na casa dos pais de Débora para visitá-la

Isso mesmo meu caro leitor, VISITA-LA (Algumas palavras passam despercebidas dos nossos olhos e não seria diferente com os olhos de Débora).

Eram as primeiras letras se apagando no tronco da árvore.

Tentaram de tudo, inclusive viajar para a Europa. Novos ares. Novo Mundo?

- França? E por que não Alemanha?

- eu prometo que nós passaremos por lá para conhecermos.

Nem no velho continente conseguiram resgatar aquele velho sentimento amoroso. Amoras são frutas vindas da Europa? Isso pouco tem a ver com a história. Até porque o casal odiava amoras...

Amoras são frutas perfeitas para o Paulo Leminski:

Amoras

morra

amor de

ora

em

ora

Longe de ser um poema de Leminski, bem poderia ser de Paulo, o Coelho. Onde a frieza convive bem com as palavras. Na de Rodrigo também...

Os dois acostumaram-se com o inverno do cotidiano.

No trabalho Rodrigo conhecia sua nova chefe, Denise. Uma mulher. Sim. Principalmente no termo popular. Madura e independente nos termos modernos (para mais detalhes, leia o próximo capítulo).